Não é nas coisas exteriores utilizadas pelo homem que se encontra o vício, mas no próprio homem que usa mal delas. E esse mau uso pode acontecer de duas maneiras. Primeiramente, considerando-se o costume das pessoas com quem se vive. Por isso, diz Agostinho: “Os excessos contrários aos costumes humanos devem ser evitados, respeitando suas diversidades. Uma convenção estabelecida numa cidade ou num povo por costume ou por lei não deve ser violada pelo capricho de um cidadão ou de um forasteiro, pois toda parte em desarmonia com o seu todo é uma aberração”.
Em segundo lugar, o mau uso dessas coisas da aparência exterior pode vir também de uma descontrolada afeição a elas por parte do usuário, levando-o, por vezes, a utilizá-las de modo sensual demais, esteja ele de acordo ou em desacordo com os costumes locais. Por isso, recomenda Agostinho: “Não se deve usar nada com paixão, pois esta não só ofende, perversamente, o costume daqueles entre os quais se vive, como também, ultrapassando-lhes, muita vez, os limites, manifesta, com rompantes escandalosos, um descaramento antes escondido sob o véu de costumes públicos”.
Ora, essa afeição desordenada pode manifestar seu exagero de três formas. Primeiro, quando se busca o prestígio social mediante um modo refinado de vestir-se e de enfeitar-se. Por isso, diz Gregório: “Julgam alguns que não é pecado usar um vestuário fino e precioso. Mas se não o fosse, jamais a palavra de Deus teria dito que o rico, atormentado no inferno, estivera vestido de linho fino e de púrpura, pois ninguém traja roupa preciosa, isto é, superior à sua condição, senão por vanglória”. ― Outra manifestação dessa exagerada preocupação com a roupa acontece quando nisso se buscam os prazeres do corpo, vendo na roupa um atrativo para tais prazeres. ― E a terceira manifestação seria a preocupação exagerada com a roupa, ainda que não interfira nenhuma finalidade má.
A essa tríplice desordem Andronico opõe três virtudes relacionadas com a apresentação externa. Uma é a humildade, que exclui a busca da glória e, segundo ele, “não se excede em gastos e enfeites”. ― Outra virtude é o contentar-se com o suficiente, o que exclui a busca da afetação. “É o hábito de se satisfazer com o necessário e que determina o que é conveniente para se viver”, de acordo com a palavra do Apóstolo: “Se temos alimento e vestuário, contentar-nos-emos com isso”. ― Por fim, tem-se a simplicidade, que exclui a preocupação exagerada com essas coisas, e que ele define como “o hábito pelo qual nos contentamos com o que nos é dado”.
Olhando, agora, a questão pelo lado da deficiência, podem-se distinguir duas desordens segundo o afeto. A primeira, por negligência, quando não se tem cuidado nem diligência em se vestir corretamente. Por essa razão, o Filósofo diz que é relaxamento “deixar o manto arrastar-se pelo chão, sem nenhum empenho por levantá-lo”. ― A segunda é a dos que se vangloriam dessa mesma falta de cuidado com a aparência. Por isso, Agostinho diz que “pode haver vaidade não só no brilho e no luxo dos ornatos do corpo, mas até numa apresentação negligente e degradante e tanto mais perigosa quanto procura nos enganar, a pretexto do serviço de Deus”. E o Filósofo diz que “tanto o excesso quanto a deficiência dizem respeito à jactância”.
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SANTO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. II-II, q.169, a.1.
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